terça-feira, 4 de maio de 2010

Educação para a liberdade: vespas ou humanos?

           Acreditar no acaso, que traz consigo tudo o que precisamos ouvir em um determinado momento, porque ele se perpetua ciclicamente. São possíveis coincidências diárias? Ao ler “Sobre palavras e redes” – “Conversas com quem gosta de ensinar” – Rubem Alves), percebo que tenho que ler e reler os parágrafos mais de uma vez, pois em qualquer prosseguimento da leitura, há uma interrupção de pensamentos que distanciam e aproximam minha mente do que foi lido e do que é vivenciado.
          Ao contrário das vespas, ou quaisquer outros animais, para os quais o comportamento – “aprendizagem” – é instintivo para a perpetuação da espécie, o que os polpa que qualquer sofrimento e angústia, mas reduz suas vidas à chegada da morte; o caso dos animais humanos é diferente.
            Se, como diz Morin, o humano apenas nasce humano, mas deve aprender sua humanidade, a genética ocupa apenas um plano de fundo no desenvolvimento da vida.
            De tal forma, a humanidade só se desenvolve dentro de um espaço de consenso, em uma cultura, é ensinado, é aprendido. Ou ainda, seguindo os passos de Fernando Pessoa: “Sou o intervalo entre o meu desejo e aquilo que os desejos dos outros fizeram de mim”. Tal como acontece com os demais animais, “a contínua obra de nossa vida é construir a morte” (Montaigne). Todavia, como dizia Sartre, embora desde o momento do nascimento, caminha-se para a morte, nesse meio tempo há vida. O que fazer nesse meio tempo?
            Uma vez que inexiste natureza humana, mas ensino-aprendizagem do conhecimento humano através da linguagem, como transformar a educação em um espaço para humanizar o humano? Ludwig Wittgenstein entendeu os limites do nosso mundo como os limites da nossa linguagem. Quando há linguagem, o objeto não mais está presente, pois se estivesse, a linguagem seria supérflua: é uma criação de representação de algo que não mais é. Uma vez que a realidade é criada pela linguagem, o que não equivale a dizer que não existe o objeto em si, mas que o humano vive o objeto para si, como utilizar a linguagem para a construção de uma nova realidade? Será possível transformar os limites do mundo humano de uma forma planetária, não visando uma igualdade cultural, que não seria desejável pela anulação da diferença na identidade; mas por um planeta realmente humano?
            Rumar para uma sociedade mais justa e igualitária? Como falar em diminuição das angústias quando, igualmente, se fala em mal do século (ou do novo século)? Como diminuir vazios existenciais, além da luta contra o frio e a fome identificados por Orwell? Além disso, para minhas perguntas, não quero respostas ou universalismos de chegada (como em Herrera Flores). Quero sim, novas perguntas. Quero que os universalismos de chegada se transformem em pontos de partida. Com respostas, não saberia viver.
            Considerar a educação do humano, portanto, não apenas como preenchimento temporal para a perpetuação da espécie – vida e morte –, mas como forma de libertação do humano para que, em sua “fadada” liberdade, possa viver intensamente em sua humanidade e co-construir o mundo no qual pretende viver. A educação como simples reprodução – Bourdieu –, como arquivamento mecânico de idéias e pensamentos desconexos, apenas equivaleria a transformar o humano em vespa.
            Sendo metade razão (ou pseudo-racionalidade obscurecida por ilusões) e metade paixão (ou pulsão), o humano precisa de uma educação para a humanidade, para a construção de sua dignidade humana (vida digna de ser vivida), na qual se insira a reflexão e a autocrítica. Precisa de sonho, de música, de pintura, de poesia: de arrepio, de sentimento, de emoção, precisa transpor-se. Precisa de multiculturalismo, de cores, de diversidade. Como proceder? 

Por: Leilane Grubba
Postagem: Prof. Ruben Rockenbach

5 comentários:

  1. Lendo este texto lembrei de um comentário que outrora eu ouvira:

    "Não existe 'ciência exata' e 'ciência humana'. Existem, sim, focos diferentes; mas toda ciência deve ser humana, pois se o homem não for o fim último, sequer se pode falar em ciência... é mais cabido falar em ignorância!"

    Leonardo Neves

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  2. Leilane: sua erudição me levou a um prognóstico sobre seu futuro: professora! Lamento informar, mas assim como o Morin, o R. Alves, o Wittgenstein, o Ruben Manente e o Sandro Sell (que time, heim?)você está com sintomas acentuados de intelectualite epidérmica. O único dos citados que não sofreu desse mau foi o senhor Montaigne, o barão de Montaigne, que, à sua época foi prefeito (o que é uma escolha mais sensata), mas foi ele mesmo que disse que não adianta ninguém se achar muito pois no mais elevado e dourado dos tronos o ser humano ainda terá o contato entre seu ser e o ouro do trono mediado pela própria bunda, que, preferências nacionais à parte, nos nivela ao nível do prosaico, do mundano, do animalesco...
    Poratnto, se é para nós humanos sermos ridículos (sendo prefeitos, professores, juízes ou julgados) que façamos o que é mais divertido. E aí ser professor é o que há. A gente pensa para trabalhar e trabalha pensando, isso é que é ofício. Os ônus são a as listas de chamadas, os diários de classe, o salário, o salário e o salário. No mais, continue assim, o mundo precisa de nós, embora não esteja muito disposto a nos pagar por isso. Já te falei sobre o salário, não?
    Abraço, Sandro

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  3. "Sendo metade razão (ou pseudo-racionalidade obscurecida por ilusões) e metade paixão (ou pulsão), o humano precisa de uma educação para a humanidade, para a construção de sua dignidade humana (vida digna de ser vivida), na qual se insira a reflexão e a autocrítica. Precisa de sonho, de música, de pintura, de poesia: de arrepio, de sentimento, de emoção, precisa transpor-se. Precisa de multiculturalismo, de cores, de diversidade. Como proceder? "

    O ser humano precisa se sentir humano e ter a oportunidade de expandir o que ele possui de mais bonito a consciência!

    muito bom flor!

    beijos
    Muriel

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  4. Leonardo e Muriel querida, agradeço os comentários :)

    Sandro: A educação mesmo só pode ser fruto de paixão, mas ninguém pode saber-se apaixonado sem ter vivenciado a situação, ou cairíamos num platonismo, né? risos! Dizer que quando acordei para a vida me vi completamente imersa nessa paixão por ensinar, vocês, meus amigos, sabem. Gostaria apenas de agradecer, a ti, Thiago, Ruben e Beto, que desde o início me receberam em suas salas e contribuíram para com esse "acordar". Fico feliz que essa des-coberta (e nesse sentido eu quero frizar o des-cobrir os olhos que algo que acredito que carrego no ser)tenha vindo junto com vocês, amigos que eu tenho até hoje. Grande abraço!
    Leilane

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  5. Sabe o que tem de melhor nesse blog? Vocês, os professores! A paixão que vocês têm em ensinar é completamente visível e me fascina. Pra mim, essa paixão deveria ser pré-requisito. Haiuhaiua...

    Beijo, e continuem assim!


    “Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.” (Cora Coralina)

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