terça-feira, 15 de junho de 2010

Monstros S.A.

"Não enfrente monstros sob pena de te tornares um deles. Lembra-te: se contemplas o abismo, a ti o abismo também contempla." F. Nietzsche

Os que chamam os nazistas de monstros, assim como os que chamam de monstros os criminosos, querem no fundo é negar que a maldade, a estupidez e a indiferença extrema sejam coisas da nossa espécie. É uma forma de dizer: “esses vícios não pertencem à humanidade: são coisas de seres hediondos, teratológicos, animalescos...”.
Com tal linguagem, cria-se, sub-repticiamente, uma raça humana purificada: da qual criminosos e outros “degenerados de caráter” não fazem parte (idéia análoga a dos nazistas acerca dos judeus).
Parece mais honesto admitir o óbvio: eles (nazistas e hediondos) fizeram o que fizeram por serem, assim como nós, humanos.
(Dado que só os humanos possuem códigos morais, só os humanos podem ser cruéis por perversidade singular ou ideologia coletiva).
Desumanizar o violento (seja o nazista ou o criminoso genérico) é compartilhar do mesmo ideário deles só que com sinal trocado.
É isso que os detratores dos direitos humanos nunca compreenderam: quem começa tratando os criminosos como monstros acabará se considerando como “puro”. E daí para a construção de uma mitologia racial que separe o "nós" e o "eles" em campos de concentração (mentais ou físicos) é só um pulinho.
A violência é uma possibilidade humana, que pode e deve ser controlada, sem que precisemos negar a humanidade de ninguém, sob pena de assumirmos o discurso dos que condenamos, e cairmos no mesmo abismo.

Sandro Sell

4 comentários:

  1. Penso que falta um pouco de alteridade dentro de nós para percebemos que o outro, é o resto de nós mesmos.
    Nossos olhos se negam a ver aquilo que não é o belo, e quando os vêem, os submetem a todo tipo de tratamento subumano, como se eles não pudessem fazer parte do nosso mesmo espaço.
    Os traficantes e estupradores parecem terem saídos da caixa de pandora e estão na terra para nos aterrorizar... o que poucos percebem é que essas mesmas besta-feras também são pais, filhos, irmãos e também tem coração (apesar de a sociedade estabelecida, como tal, não concordar).
    É aqui que entra a teoria psicanalista Freudiana e a teoria do bode-expiatório: ao passo em que os tratamos como monstros, nós deixamos os monstros que existem dentro de nós, se manifestarem. No fundo, no fundo, quando vemos presos serem torturados, nós agradecemos que isso tenha acontecido (pois no fundo, nós queríamos tê-los violentados), mas agradecemos por não ter sido necessário sujar nossas mãos.
    E assim caminha a humanidade...

    ResponderExcluir
  2. Você foi perfeita nas suas colocações aqui e no post anterior, - meu post é apenas um comentário do seu, como deve ter ficado claro: como me alonguei demais, postei ao invés de comentar (o seu aqui também daria uma nova postagem). parabéns, e poste mais vezes,pois o que é óbvio para alguns de nós, ainda é um pensamento estranho para muitos outros.
    Sandro

    ResponderExcluir
  3. Adorei Sandro. Saudade de ler seus textos, saudade de escrever aqui. =( Tô precisando de TEMPO!

    Beijos

    ResponderExcluir
  4. Exatamente Sandro!

    Aliás, qual de nós pode afirmar que não faria tais coisas se nossa realidade fosse diferente ou nos fosse dada uma oportunidade...

    "(...)para que a ira do SENHOR teu Deus se não acenda contra ti e te destrua de sobre a face da terra.". Deuteronômio 6:15

    Opa, de até o próprio "Deus" se ira...

    ResponderExcluir