sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Sorte e justiça I



Platão dizia que sorte é quando a flecha lançada atinge o cara ao lado e não você. Uma definição que tem ressonância no cotidiano e nas grandes tragédias aéreas. Quando um avião cai, sempre se entrevista alguém que iria embarcar, mas que, no último momento, desistiu ou que, por falha da companhia aérea, teve seu assento dado para outro. Sendo religioso, o entrevistado revelará todo seu senso de piedade cristã dizendo: “Graças ao bom Deus, não pude embarcar... agradeço também a minha mãe que sempre reza por mim...Sim, brilhante!, segundo essa lógica, Deus atendeu às preces de sua mãe e mandou no lugar dele um outro humano para morrer! Isso é que dá ter mães no SPC/SERASA lá de cima!
Depois não adianta rezar. Nem em grau de apelação. A propósito a ementa de um eventual acórdão dessa decisão na Corte Celeste de Apelação, imagino, seria algo como:
Prece intempestiva. Pedido que para ser satisfeito demandaria a realização de milagre. Merecimento não demonstrado. Precedente: “Diferentemente da prece-agradecimento, a prece-pedido deve ser protocolada quando a situação ainda é factualmente reversível. Dormientibus non sucurrit jus. (Superior Celestial, Apelação 709/00033, Rel. San Tiago de Compustela). Recurso conhecido a que se nega provimento.

Não é estranho?

Mas não se zangue, leitor-carola, não estou questionando a Justiça Divina, mas sim o caráter inconseqüente dos raciocínios usuais em relação a ela. Coisas como meu santo é forte (tradução religiosa de “Não se meta comigo, meu deputado é poderoso”) mostram uma interpretação no mínimo não republicana da Eterna Justiça. “A cada um segundo suas obras”, parece mais compatível com uma idéia de justiça do que a idéia de que o Céu cristão seria semelhante ao Olimpo, onde a sorte de cada um variava proporcionalmente ao poder do deus que o representava.

Mas é sobre sorte e Direito que pretendia falar. Mas agora que me alonguei, deixo isso para amanhã...
Sandro Sell

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