segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Fugir não é um direito do preso...

"Direito" é mesmo um conceito equívoco...

Outro dia, um ministro de tribunal superior dizia a respeito de um conhecido sujeito que se negava a apresentar-se à Justiça:
“Fugir é um direito do preso...”
Não sei o que pensam os outros, mas para a gente que veio lá de Palhoça quando alguém diz “você tem um direito” equivale a dizer que você pode fazer aquilo sem receio de sofrer aborrecimentos legais por tal exercício.
Mas não é fato corriqueiro que se o sujeito apenas ameaçar o exercício de tal direito – e arrumar as malas – já vai ter decretada sua prisão preventiva? (“não não vai não, Sebastião!”)
E não é menos fato que se fugir quando já estiver na fase da execução da pena, cometerá falta grave, perderá os dias remidos, perderá o tempo já contabilizado para a progressão de regime, o direito à livramento condicional? Em resumo: ferra-se todo!
E não é fato tristemente corriqueiro que se ele, exercendo o tal direito, não parar sua desabalada carreira quando solicitado, vai levar chumbo da polícia?
E que se esses tiros forem nas pernas do fujão, vai-se dizer que se tratou de estrito cumprimento de um dever legal (ué, mas na literalidade da fala do ministro, o fugitivo não estava em exercício regular de direito?... excludente de ilicitude contra excludente de ilicitude?)
“Ou vais me dizer que, agora que o tiro já me deixou manco e mais preso do que nunca, que o que o ministro queria dizer com essa frase era simplesmente que fugir sem violência à pessoa não é crime?!”
“Acho que era bem isso que ele queria dizer...”
“Que maravilha! Então vê se ele não tem uma muleta sobrando... ah, e pergunta quando vai ser a próxima aula...
"Sebastião, não fala assim... a questão é complicada..."
"Complicado!? Complicado é eu voltar a andar..."


Sandro Sell

4 comentários:

  1. Parabéns, finalmente alguém disse algo com pelo menos um pouco de reflexão sobre esse assunto, dizer que uma coisa é assim porque é, sem nenhuma explicação, é dizer nada.

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  2. Olha, professor, confesso que pra gente aqui de Biguaçu, a equivalência é a mesma... hehehe
    Muito bom!

    Abraço

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  3. Toda a argumentação feita, ainda que ligada à legislação penal que restringe o direito, não consegue, por si só, tirar o caráter de direito do direito à liberdade que é inerente a todos, inclusive ao preso. A pena de prisão não descaracteriza o direito, o restringe é verdade, mas não o descaracteriza, não o transforma em não-direito, em menos direito. É a própria Constituição que garante tal direito e o afirma, em assegurar que as penas não serão perpétuas, por exemplo.

    Por esse viés, penso que fugir é um direito sim do preso e que não fica obrigada a pessoa com um mandado de prisão a se entregar à polícia ou ao judiciário, há instrumentos jurídicos que podem, inclusive, derrubar um possível mandado de prisão sem que o réu tenha que se "apresentar" para ser preso.

    Por fim, grande parte dos dispositivos colacionados necessitam urgentemente ser revistos, ou melhor, vistos a partir do prisma jurídico que os inaugura, ou seja, a própria Constituição.

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